Atletas de grande prestígio dando a volta por cima recuperados de lesões, jovens atletas se firmando, revelações despontando na categoria adulta. O Troféu Brasil de Ginástica Artística, encerrado no domingo (22) em Porto Alegre, foi pródigo em histórias de superação, abrindo o ciclo olímpico num tom que promete muitas emoções até Paris-2024, desde já criando muitas expectativas para o Campeonato Pan-Americano, que será disputado no Rio de Janeiro, de 11 a 17 de julho – é um evento classificatório para o Mundial de Liverpool.
O duelo entre Flávia Saraiva, finalista olímpica (2016 e 2020) e Rebeca Andrade, finalista do Mundial-2021, foi um dos pontos altos da disputa. Flavinha, livre das dores no pé direito, deu show: uma série fluida, com todos os elementos ligados e raros momentos de desequilíbrio, finalizada de forma brilhante com um duplo mortal para frente com meia volta. Rebeca foi quase tão brilhante quanto a colega de Flamengo e de Seleção, mas teve mais momentos de instabilidade, sendo superada por apenas um décimo (14.433 a 14.333).
Flávia decidiu dividir os méritos pela conquista. “Esta vitória é fruto de um bom trabalho, de uma boa recuperação. Tenho que agradecer muito à minha equipe multidisciplinar, à minha família, às minhas amigas, a Deus. Foi um trabalho em equipe muito grande para eu conseguir chegar aqui e ter esse resultado. A vitória não é só minha, é de todos nós. Eles me ajudaram a acreditar que posso confiar em mim de novo”.
O trabalho conjunto, com treinadores e com Rebeca, também teria um peso fundamental, na análise da campeã na trave. “Eu e a Rê atentamos a todos os detalhes dessa prova. Analisamos como melhorar a nota de partida, a caprichar na execução da série. Trabalhamos em cima de todos os pontos”.
Outro belo momento, que fez o ginásio da Sogipa vibrar, foi envolto por fumaça de pó de magnésio: era a tradicional comemoração de Arthur Nory que voltava – uma única batida das palmas das mãos causa aquele efeito, à la Lebron James -, acompanhada por um sorrisão. Depois de ficar fora da final olímpica e da do último mundial na barra fixa, Nory, campeão nesse aparelho no Mundial de Stuttgart-2019, fez uma série praticamente irretocável, tendo como pontos altos uma série de três largadas e retomadas perfeitas e uma saída cravada. O medalhista olímpico e mundial teve que caprichar, desafiado que estava por uma excelente apresentação de Diogo Soares, que acabou levando a prata.
Depois de seu último exercício em Porto Alegre – subiu no pódio mais três vezes no segundo dia de finais – Nory destacou a importância de se apresentar num ginásio cheio. “Gostei muito de competir com o público, de sentir toda essa energia. Pude testar séries novas neste começo de ciclo, e isso é muito bom. É fundamental poder ter esse parâmetro para as próximas competições do ano”.
No salto, outra figura conhecidíssima – e admirada – da Ginástica Brasileira mostrou sua habitual competência. Finalista nesse aparelho no Mundial de Doha 2018 e nos Jogos Olímpicos de Tóquio, o versátil ginasta de Volta Redonda já havia deixado o ginásio sem fôlego com seu primeiro salto, um rodante com entrada lateral que atingiu altura impressionante, suficiente para executar uma tripla pirueta. Quem não conhece o ousado ginasta de Volta Redonda poderia esperar um segundo salto mais conservador, o suficiente apenas para manter a média elevada e lhe dar o ouro. Foi nesse momento que ele arriscou ainda mais, com um duplo mortal para frente acompanhado por uma meia volta precisa no final, só para não deixar dúvida alguma sobre seu domínio no aparelho.
Não satisfeito, Caio depois foi disputar a final da paralela, e novamente brilhou: com elementos de difícil execução, como dois duplos mortais, o experiente competidor esteve sempre muito bem estabilizado, e levou outro ouro, superando outro destaque na polivalência, Diogo Soares, por pouco.
Caio avaliou de forma positiva seu desempenho em Porto Alegre. “Embora tenha havido falhas em alguns aparelhos, foi muito boa esta minha primeira competição no ciclo. Consegui acertar coisas antigas e coisas novas. Isso é muito importante, ver que o trabalho deu certo”, afirmou o ginasta.
Diogo, que fez sua primeira competição pelo Flamengo, fez um balanço bem favorável sobre sua participação no Troféu Brasil. Ele deixou Porto Alegre com uma medalha de ouro (solo) e três de prata (barra, cavalo e paralela). “Gostei bastante dos resultados. Sempre vou ter erros que vão me obrigar a voltar ao ginásio para treinar, mas no geral estou bem feliz. Esta competição não era o foco, mas volto para casa muito satisfeito e pronto para continuar trabalhando bastante, para corrigir o que não foi tão bom”.
O jovem piracicabano, que impressionou o público brasileiro da ginástica ao se colocar entre os finalistas olímpicos do individual geral com apenas 19 anos, se disse muito feliz também por ter chegado bem perto de Caio Souza, que teve os melhores resultados individuais em Porto Alegre: o ginasta do Minas Tênis Clube conquistou dois ouros (paralela e salto), uma prata (solo) e dois bronzes (argolas e cavalo). “Fiquei bem pertinho do Caio, e fico muito contente com isso, porque ele é nossa referência, o melhor generalista do Brasil no momento. Eu já me vejo não só nos calcanhares dele, mas já estou escalando nas costas dele. Mas, brincadeiras à parte, o foco nunca foi ganhar de ninguém. A gente brinca, com o Nory e às vezes com o Caio: ‘ah, vou ganhar de você’. Mas isso é só uma brincadeira saudável. Cada um tem o seu esforço, os seus objetivos. Os meus são acertar minhas séries e voltar ao ginásio para continuar treinando e poder voltar para este campeonato aqui e ganhar seis de ouro, independentemente de quem estiver em segundo”.
Por fim, o tablado do solo foi o palco perfeito para o público acompanhar os futuros talentos da ginástica. Na final, Andreza de Lima, que completou 15 anos neste domingo (22), foi premiada ao apostar numa série ligeiramente mais difícil do que a de outro jovem talento, Gabriela Barbosa. Na execução, as duas ficaram empatadas com 7.967. Destaque também para Hellen Carvalho, 14 anos, que ficou em quarto lugar, bem perto do pódio. É a novíssima geração pedindo passagem.
Foto: Fernando Gomes/CBG
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