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Do calor do litoral, ao frio da neve: conheça Bruna Moura, atleta do esqui cross country, que luta por vaga em Pequim 2022


A expressão em língua inglesa denominada ‘plot twist’, que significa uma grande reviravolta em narrativas de filmes e séries, é a melhor definição para a vida da atleta Bruna Moura. Oriunda do ciclismo mountain bike, a caraguatatubense passou por diversos ‘perrengues’ até chegar em sua modalidade atual, o esqui cross country. Hoje, ela é uma das esquiadoras que lutam por vaga nos Jogos Olímpicos de Inverno Pequim 2022.

Para quem não sabe, Caraguatatuba é um município do Litoral Norte do estado de São Paulo e fica muito próximo a cidades como São Sebastião e Ubatuba, celeiro de atletas do surfe nacional, como por exemplo, o três vezes campeão mundial, Gabriel Medina.

Mas ao invés de se aventurar no mar, Bruna gostava mesmo é da terra. E ela foi por algum tempo uma das maiores esperanças no mountain bike brasileiro, esporte onde era bicampeã nacional na categoria júnior e integrava a equipe do projeto MTeenB, criado pela também ciclista Jaqueline Mourão, que tem diversas participações em Jogos Olímpicos de verão e inverno. E essa relação com Mourão tornou-se fundamental para a história de vida de Bruna.

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O diagnóstico que mudou a vida de Bruna Moura

Após alguns títulos entre 2010 e 2011, boas participações em torneios internacionais de peso, além de muita expectativa criada em torno de seu desenvolvimento, Bruna recebeu um grande baque: foi diagnosticada com Comunicação InterAtrial (CIA), um problema congênito que cria um buraco na parede entre as câmaras superiores do coração (átrios).

A cada competição que eu disputava, e elevava meus batimentos cardíacos, eu corria o risco de ter uma morte súbita. E em todos esses anos treinando pesado e participando de eventos, eu não sabia. Então quando o médico me falou que em qualquer momento eu poderia cair dura, foi um choque.
Bruna Moura foi uma das principais representantes brasileiras na categoria juvenil do mountain bike. Foto: Arquivo pessoal/Bruna Moura

O médico responsável pelo diagnóstico de Bruna tinha uma recomendação de imediato. Que ela abandonasse o esporte. No entanto, só isso não seria o suficiente, e num futuro não tão distante esse problema detectado iria novamente afetar sua vida. Então a coisa certa a se fazer era uma cirurgia. E é neste ponto que a amiga e conselheira Jaqueline Mourão ganha ainda mais importância.

Bruna tinha duas opções de cirurgia. Uma feita por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), de forma gratuita e outra, por médicos particulares, em que o procedimento poderia custar até R$ 100 mil. O problema é que a opção sem custos era a com mais riscos, pois o tórax de Bruna deveria ser aberto para tal procedimento, enquanto na cirurgia paga, era tudo realizado via cateterismo.

Quando recebi o diagnóstico, eu não aceitei aquilo. Não quis parar de competir. Havia uma programação de eventos importante para seguir ainda. Até que no Campeonato Pan-americano de Mountain Bike, realizado no México, eu senti um forte gosto de sangue na garganta, algo que nunca havia me ocorrido antes, seguido de muita falta de ar. E quando voltei para Caraguatatuba, levei uma grande bronca do médico. Aquilo que aconteceu era o meu sobrecarregamento.

Foi Jaqueline Mourão quem estendeu a mão para Bruna e correu atrás da possibilidade de conseguir um meio para que a cirurgia via cateterismo fosse realizada. “Essa era a opção que eu mais queria, mas eu não tinha condições para isso de forma alguma. E foi aí que a Jaque acabou me ajudando né, ela que correu atrás e conseguiu essa cirurgia para mim de graça, através de uma pesquisa do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo”, explicou a esquiadora.

A retomada na vida esportiva

Mas se engana quem pensou que o ‘plot twist’ da vida de Bruna parou por aqui. Pouco antes da realização do procedimento médico, Bruna teve sua primeira experiência com o rollerski, modalidade semelhante ao esqui na neve, mas que é praticada no asfalto.

Bruna em treinamento de rollerski, nos Países Baixos. Foto: Arquivo pessoal/Bruna Moura

Afastada do mountain bike, a atleta participou de uma clínica de rollerski em São Carlos, no interior de São Paulo, a convite de Jaqueline Mourão, que também é atleta de esqui cross country. E ali ocorreu também seu primeiro contato com a Confederação Brasileira de Desportos na Neve (CBDN). Após dois dias de treinos leves, Bruna já demonstrava algum jeito com o esporte.

Me ofereceram a oportunidade de ficar com o equipamento de rollerski, para eu praticar de forma contida, mas manter meu desenvolvimento. Mesmo com meu problema de saúde e as incertezas sobre a realização da minha cirurgia, eles acreditaram em mim e me deram a chance para que eu continuasse no esporte. E lá vai eu para Caraguá com o rollerski né. Já ao descer na rodoviária eu queria praticar. Mas não deu muito certo não, havia muitos buracos na rua.

A cirurgia foi feita em 2013 e alguns meses depois, Bruna já poderia retomar suas atividades como atleta. Ela chegou a voltar um período ao mountain bike, mas encontrou muitas dificuldades para recuperar o patamar em que estava antes do problema de saúde. Até que a atleta resolveu agarrar a oportunidade dada pela CBDN, que sempre manteve suas portas abertas. Lá, Bruna encontrou apoio para seguir seu sonho: disputar os Jogos Olímpicos, desta vez, focada na edição de inverno.

A corrida para Pequim 2022 e a falta de patrocínio aos esportes de inverno

O Brasil já tem duas vagas garantidas no esqui cross country para os Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim. Porém as representantes ainda não estão definidas e Bruna está no páreo para quem sabe conquistar sua vaga. Atualmente a brasileira recebe uma mentoria da letã Baiba Bendika, atual campeã europeia de biatlo 7,5 km sprint.

É uma preparação um pouco diferente, do que vinha fazendo antes. Devido a essa mudança, tudo se torna um pouco mais assustador, mas considerando que estive forte em alguns períodos em outras temporadas e fiquei fraca quando mais precisava de desempenho, com essa preparação de agora, estou muito mais confiante.


Bruna em evento de esqui cross country. Foto: Arquivo pessoal/Bruna Moura

Mas nem tudo são flores no esporte de inverno. Bruna revelou ao Surto Olímpico, que ao questionar a falta de apoio do município, ela recebeu a resposta de que o esqui cross country não era uma das modalidades oferecidas pela cidade, e portanto não haveria uma forma de ajudar.

Questionada no mês passado sobre a situação, a Prefeitura de Caraguatatuba disse ao Surto Olímpico que “no ano de 2019, a atleta recebeu apoio para a compra de equipamentos, mesmo sem a inscrição devida no Bolsa Atleta, para assim, auxiliá-la na prática de seu esporte”. A atual gestão ainda reiterou, dizendo que em seus quatro anos de gestão (desde 2017), não recebeu inscrições da atleta para projetos em que ela poderia receber apoio do município.

Ainda assim, Bruna reforça o argumento da dificuldade de encontrar patrocinadores, até mesmo no setor privado.

Há muito essa ideia de que nós não conseguiríamos trazer visibilidade às marcas, por se tratar de um esporte de inverno, um esporte que não temos aqui dentro do Brasil. Tem sido até mais fácil conseguir apoio de uma empresa de fora, que produza algo específico da sua modalidade. Porque no Brasil é difícil mesmo. Infelizmente esse é o nosso cenário.

 

Após a resposta da Prefeitura de Caraguatatuba, a esquiadora Bruna Moura prestou um esclarecimento sobre a situação, na atualização a seguir: "Ganhei um salário em 2019, porque estava trabalhando como instrutora de pararollerski no Centro Esportivo da cidade, mas não tive nenhum apoio por ser atleta. Desde que iniciei minha carreira no esqui, eu também tentei por vários anos ser incluída no Projeto Fundo de Incentivo ao Desporto Amador (programa de bolsa atleta do município), mas exceto por três meses em 2017, isso sempre foi negado. Até hoje eu não tenho nenhum apoio mesmo com eles sabendo da minha carreira e busca pela vaga olímpica".


Os Jogos Olímpicos de Inverno ocorrem entre os dias 4 e 20 de fevereiro de 2022, em Pequim, na China. Assim, a cidade-sede se tornará a primeira no mundo a receber os Jogos Olímpicos de verão (2008) e de inverno.


Foto: Arquivo pessoal/Bruna Moura

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