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Daniel Cargnin é a prova que emoção e estratégia podem trabalhar juntas

Daniel Cargnin judô medalha

Os protagonistas do domingo (25) nos Jogos Olímpicos de Tóquio tinham nomes e um mesmo sobrenome: Abe Uta e Hifumi, irmãos, ambos bicampeões mundiais e que buscavam a glória olímpica no Budokan. No mesmo templo sagrado do judô, outros judocas buscavam seu lugar ao sol e a oportunidade de desafiar os irmãos japoneses. Daniel Cargnin foi um deles, e com o bronze alcançado entrou para a história do judô brasileiro.

Daniel Cargnin era a surpresa que já esperávamos na categoria masculina. O nosso guia já mencionava ele, comentando que "o brasileiro tem potencial para surpreender e, quem sabe, sonhar com uma medalha em Tóquio". A mesma crença estava depositada em Larissa Pimenta, mas que até nisso a gente previu certo, "a atleta não será cabeça de chave, correndo o risco de enfrentar uma das favoritas logo nas primeiras lutas". 

Daniel Cargnin Abe Hifumi judô
Foto: Breno Barros/rededoesporte.gov.br

Quis o destino que os nossos brasileiros fossem cair na chave dos irmãos Abe e que estes estivessem num dia iluminado. Abe Uta dominou por completo Pimenta, já na segunda rodada, e a brasileira foi eliminada. Cargnin encarou Abe Hifumi já na semifinal, mas mesmo assim partiu para a cima e tentou impor seu jogo, até ser derrubado pelo principal favorito.

Enfrentando apenas top20 do ranking, Cargnin estreou com vitória Mohamed Abdelmawgoud (19°), passou pelo moldávio Denis Vieru (15°) nas oitavas e o líder do ranking, Manuel Lombardo, da Itália nas quartas. Após cair para Abe, apenas 5° do ranking, o brasileiro venceu o bronze diante do israelense Baruch Shmailov (8°).

A depender das entrevistas que ele deu para a imprensa presente, seja na coletiva e zona mista, foram três as chaves para a medalha: a ligação com a família e as estratégias montadas.

Campeão inesperado na Rio 2016 foi inspiração

Ele dedicou a conquista à sua mãe, Ana Rita, enfermeira e que também já praticou o judô. Ele afirma que precisou sair de casa para melhorar o seu jogo e que se sentiria bem trazendo algo de concreto para a sua mãe na próxima vez que se encontrarem. Devido aos Jogos Olímpicos de Tóquio eles estavam se vendo esporadicamente, mas Cargnin conta que a conexão dele com a mãe e a irmã é muito grande.

Essas emoções são carregadas para outras pessoas de seu círculo também, como a Sensei Yuko Fujii - "pensei em como ela nunca desistiu de mim". Cargnin ainda revelou ter sido inspirado pela inesperada conquista do italiano Fabio Basile, em sua categoria (66kg) na Olimpíada do Rio. "Ali eu vi uma esperança. Se alguém que não era cotado conseguiu ser campeão, porque eu não?".

Foto: Breno Barros/rededoesporte.gov.br

Gaúcho de 23 anos, ele se mostrou muito reservado e grato por tudo que vive. "Tive um pouco de humildade. Agora eu posso passar para o povo do Brasil um pouco de esperança", contou. Ele ainda diz ter percebido que o italiano Lombardo iniciou o combate com uma estratégia diferente e sentiu que poderia ser um respeito por ele, resolvendo explorar isso. Um dos jornalistas presentes brincou: "mas você consegue pensar em tudo isso na luta?" 

Eu sempre considerei um atleta muito estratégico. O que eu posso fazer, qual pegada eu posso dificultar. Ele é um cara mais tranquilo, confiante. Então eu pensei que se eu quebrar essa confiança dele, já é meio passo andado para a vitória

Outro momento em que deixou claro o quanto ele estuda seus resultados e adversários é quando sabia exatamente o retrospecto diante de certos adversários e como isso o ajudou na disputa pelo bronze. " Contra Shmailov, eu havia ganho a última (no Grand Prix de Tel Aviv) e ele deve lembrar". Já sobre o italiano, a quem já tinha retrospecto positivo, ele ainda aponta "pelo menos, quando a gente lutou, eu ganhei, e ele sabia disso", acredita.

Emoções são muito importantes para judoca medalhista de bronze

Daniel Cargnin era conhecido por estar sempre na disputa pelas medalhas e ter um estilo particular, um tanto diferente do judô masculino em geral. Porém, ele nunca teve grandes resultados no circuito, em geral, chegando nas disputas de medalha, mas caindo. A exceção, antes do bronze olímpico, foi a conquista do Grand Slam de Brasília, em 2019.

"Eu sempre fui emotivo. As melhores competições que eu fiz parece que tinha um propósito para aquilo. Muitas vezes eu ouvia do professor Ney Wilson para acreditar. E às vezes era difícil: 'por que eu?', sabe? Eu lembro que em Brasília, que eu ganhei, eu estava um pouco machucado. E eu comecei a me perguntar por quê ganhei, até minha mãe ter lembrado que fazia tempo que ela não me via lutar e eu vi que foi um diferencial".

"Eu me sentiria bem voltando para casa dando algo de concreto para minha mãe. Depois da convocação, eu me sinto em paz para voltar para casa e ficar em casa. e ela sempre gostou muito da minha companhia. Minha mãe fez judô, ela me esperava nos treinos, ficava preocupada quando eu tava no ponto de ônibus às 10 da noite. E aqui em Hamamatsu (base do judô), eu tenho que agradecer a quem não aparece mas é fundamental".
hifumi abe e daniel cargnin no tatame

Uma dessas pessoas é David Lima, seu sparring e colega de treino da Sogipa que foi para o Japão para ser seu sparring. Outro é Felipe Kitadai, medalhista de bronze nos 60kg em Londres 2012, e outro membro da Sogipa.

"Ele me dava a dica lá no clube que poderia ser a minha única Olimpíada. Essa dica me ajudou muito. Cada segundo eu não estava cansando, mas aproveitando. A cada luta que passava eu pensava 'é meu tempo no tatame'. Na luta do terceiro eu pensei que já estava bem feliz porque estava muito tempo na luta... mas ficaria mais feliz com o bronze".

Mas ainda tem mais espaço para melhorar. A respeito de Abe, ele disse que tentou não se abalar com o favoritismo do japonês e foi para cima. "Eu sabia que seria uma luta dura. E eu saí feliz porque em nenhum momento eu baixei a cabeça. Eu ficaria chateado comigo se tivesse perdido porque eu não acreditei. É um adversário bem difícil, mas se eu acreditei e se cheguei no bronze, o próximo passo é chegar mais". Que Abe se cuide em Paris!


Foto de capa: Gaspar Nóbrega (COB)

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