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Coluna Surtado no Esporte: como está o Handebol feminino brasileiro cinco anos após o título mundial?

Em 2018, precisamente no dia 22 de dezembro, completa 5 anos que o Brasil se sagrou campeão mundial no Handebol Feminino. Para muitos o maior feito do esporte coletivo do Brasil, em razão da desestrutura do esporte no país, principalmente comparada com as equipes europeias, com grande tradição na modalidade. 

A proeza foi ainda mais impressionante se recordarmos que o Brasil nunca havia chegado sequer às semifinais em grandes competições (mundial e olimpíada). 

E o primeiro título mundial brasileiro veio de forma incontestável. A seleção foi campeã invicta, deixando seleções de grande tradição para traz. 

Na primeira fase, o Brasil não tomou conhecimento das adversárias. Cinco jogos, cinco vitórias. Assim foram os jogos das brasileiras: Brasil x Argélia 36x20; Brasil x China 34x21; Brasil x Sérvia 25x23; Brasil x Japão 24x20; e Brasil x Dinamarca 23x18.

Na fase final, o Brasil se deparou com a Holanda nas quartas de finais. Vitória por 29x23. Nas quartas, um jogo apertado contra a Hungria. No primeiro tempo 12x11 a favor das brasileiras. No fim do segundo tempo, o jogo terminou empatado em 26x26. Na prorrogação, 3x3 no primeiro tempo e 4x2 no segundo tempo, dando a suada vitória ao Brasil e a inédita classificação para as semifinais. Na disputa por uma vaga na final, o Brasil reencontrou a Dinamarca, adversária da primeira fase, e venceu com autoridade: 27x21. Na final, outro conhecido da primeira fase, a Sérvia, dona da casa. E o final da história, todos sabemos. Vitória das meninas do Brasil por 22x20 e inédito título mundial.


O pódio foi todo formado por equipes que saíram do grupo B, o grupo do Brasil, demonstrando que o país não foi beneficiado com chave mais acessível. Ao contrário. O Brasil parecia (e foi) um “trator” naquela competição.

Embora dominante no continente Americano há alguns anos até ser campeã mundial, com diversos títulos pan-americanos e sul-americanos no currículo, o país nunca tinha chegado tão longe em uma competição dessa magnitude. 

A evolução do país nos anos que antecederam o campeonato mundial era nítida, como a primeira classificação para as quartas de final em um mundial, no ano de 2011, quando o país sediou a competição, e às quartas nas olimpíadas de Londres/2012. Porém, de boas campanhas para um título mundial, mesmo sabendo das qualidades dessa geração, foi surpreendente e imensamente prazeroso para nós brasileiros.

O avanço da seleção se confunde com a atuação do técnico dinamarquês Morten Soubak, entre 2009 e 2016. Morten trouxe qualidade técnica à equipe e, em poucos anos, a transformou em uma das grandes equipes do mundo, culminando no título mundial de 2013.

Não se pode esquecer que o Brasil contou, ainda, com uma geração de jogadoras incríveis, estrelas em seus clubes (geralmente europeus) e entre as melhores do mundo no esporte: Bárbara, Mayssa, Fabiana Diniz, Alê Nascimento, Samira Rocha, Dani Piedade, Fernanda da Silva, Ana Paula Rodrigues, Duda Amorim, Deborah Hannah, Deonise, Mayara Moura, Mariana Costa, Amanda de Andrade, Elaine Gomes e Karoline de Souza.

As perspectivas para o ciclo olímpico que acabara de se iniciar não poderiam ser melhores. A Confederação Brasileira de Handebol contava com muitos recursos para o ciclo da Rio/2016, uma geração vitoriosa e um técnico alinhado e capaz. Receita correta na busca por uma medalha olímpica inédita.

Desde o título, assim foi o desempenho do Brasil nas principais competições internacionais:

2014 – Sul-Americano de Santiago. Campeã sobre a Argentina, placar de 25-23.

2015 – Pan-Americano de Toronto. Medalha de ouro, com uma campanha invicta e sem grandes sustos.

Ainda em 2015, o Brasil defendia o título mundial na Dinamarca, principal competição do ano. Na primeira fase foi dominante, com vitórias sobre o Congo (26x21), Alemanha (24x21), Argentina (23x19) e França (21x20), além de um empate contra a Coreia do Sul (24x24). Porém, já nas oitavas de final, as brasileiras perderam para a Romênia e deram adeus ao sonho do bicampeonato.

2016 – O momento mais aguardado para essa geração: os jogos olímpicos em casa, no Rio de Janeiro. Todo o ciclo se voltava a esta competição e pelo que fez em todo o ciclo, as brasileiras detinham a confiança da torcida. 

O início foi animador. Como nas últimas competições de grande porte, as brasileiras terminaram a fase de grupos em primeiro lugar. O Brasil bateu a forte seleção da Noruega (31x28), atropelou a mesma Romênia que a desclassificou no mundial passado (26x13), Angola (28x24) e Montenegro (29x23) também foram derrotados pelas brazucas. Apenas a Espanha conseguiu bater as brasileiras na primeira fase (24x29).

Na segunda fase, porém, nas quartas de final, o Brasil enfrentou a quarta colocada do grupo B, a Holanda, mas não levou uma verdadeira sapatada: 23 x 32 e deu adeus ao Jogos Olímpicos antes do que qualquer um desejava/esperava.

Foi no fim de 2016 que o técnico dinamarquês Morten Soubak deixou o comando da seleção, encerrando seu ciclo. 

2017 – No início do ano, Jorge Dueñas foi contratado como novo técnico da seleção. Ele era, até então, técnico da seleção Júnior da Espanha, seu país de origem. E, em 2012, na Olimpíada de Londres, levou a seleção ao pódio: medalha de bronze.

Foi também o ano do último campeonato mundial do handebol feminino, sem boas lembranças para o Brasil. No grupo C, o Brasil não passou sequer da primeira fase. A única vitória, contra a Tunísia, foi bastante apertada (23x22). Dois empates, contra o Japão (28x28) e contra Montenegro (23x23). Além de duas derrotas, para a Rússia (16x24) e para a Dinamarca (20 x 22).

2018 – Sul-Americano de Cochabamba. Campeã sobre a Argentina. Placar de 25x22.

Esperando-se outros resultados equivalentes ou maiores que o mundial de 2013, vimos que a seleção retornou a um desempenho (não patamar) similar àquele antes do título: sem chegar entre os quatro melhores em nenhuma das três grandes disputas desde então: Mundial da Dinamarca 2015 (oitavas) e Alemanha 2017 (primeira fase), bem como a Olimpíada do Rio/2016 (quartas). Na Alemanha, o pior resultado em quase dez anos.

A piora nos resultados não foi a única preocupação que surgiu desde então. Após o fim do ciclo olímpico no Rio, que foi positivo, embora a derrota precoce nas olimpíadas, os recursos sumiram. Se no ciclo olímpico a Confederação da categoria recebeu quase 64 milhões, na caminhada para Tóquio 2020 a quantia é/será bem menor. O Banco do Brasil anunciou em abril deste ano (2018) que não renovaria o patrocínio. No ano anterior, os Correios já haviam diminuído o aporte financeiro à entidade. Se não bastasse, a confederação viu diminuir o montante a que tinha direito mediante a Lei Agnelo Piva, que reparte os recursos das loterias federais.

A redução dos recursos prejudicaram principalmente a base. Neste ano, por exemplo, a seleção feminina sub/18 não foi ao mundial da categoria, mesmo classificada, em razão dos problemas financeiros. Nos campeonatos de categoria de handebol de 2017, a confederação pediu auxílio financeiro para a Federação Internacional de Handebol (IHF).

De toda forma, nesses 5 anos que se passaram, talvez o pior momento do handebol brasileiro foi decorrente da crise política da Confederação Brasileira de Handebol. Em 2017, Manoel de Oliveira, presidente da entidade por 28 anos, foi reeleito. Porém, a eleição foi parar na Justiça Federal e houve decisão liminar ordenando que ele fosse afastado do cargo. A denúncia - deflagrada após a operação "Sete Metros" - foi de uso indevido de verbas, que chegaria a um montante de R$ 21 milhões de reais, oriundos de convênios com o Ministério do Esporte, notadamente quando da realização do Campeonato Mundial de 2011 no Brasil e para as olimpíadas de 2016.


Para piorar, o Tribunal de Contas da União vedou que a confederação recebesse recursos provenientes da Lei Agnelo/Piva e ainda foi colocada em um cadastro de inadimplemento.

Segundo o até então apurado, a suspeita de que os gestores da CBHb escolheram, de forma antecipada, os fornecedores das licitações. 

Na época, a Polícia Federal lançou a seguinte nota: “Os indícios até aqui reunidos apontam que, na aplicação dos valores recebidos, os envolvidos fraudaram licitações, subcontrataram pessoas físicas e jurídicas impedidas de contratar com a União, superfaturaram valores de bens e serviços adquiridos, realizaram pagamentos por serviços não prestados e por bens não entregues e falsificaram documentos nas prestações de contas, incorrendo, por isso, em diversos crimes”, diz a nota da PF.

A confederação sofre com a falta de credibilidade. É dito por muitos que a crise política foi determinante para arranhar a imagem da confederação e afastar patrocínio, aumentando a crise na modalidade.

Em novembro, o atual presidente da CBHb anunciou o acordo com a fornecedora de materiais  alemã Kempa, mas o caminho para reorganizar o handebol é longo. É difícil dizer quanto tempo para retomar a credibilidade de uma confederação que foi tão abalada.

Para se manter no topo, entendo serem necessários, pelo menos, três elementos: 1) investimento, 2) estrutura e 3) um campeonato competitivo.

O investimento, por enquanto, está escasso, sem patrocínio e com barreiras nos repasses federais. É bem menor que a realidade de 2013. No último dia 20 de dezembro, foi anunciado um aumento dos repasses da Lei Agnelo/PIVA no esporte, o que repercute positivamente para a confederação de handebol, mas ainda não representa uma recuperação suficiente. É preciso mais. Sem investimento, a estrutura, segundo elemento, pouco avança. Alguns centros olímpicos de iniciação ao esporte (CIE) foram prometidos como sendo um dos legados olímpicos. Entretanto, dos 285 centros anunciados, a maioria ainda não saiu do papel, dois anos após as olimpíadas do Rio. Seriam importantes para a prática e popularização do esporte.

Um campeonato competitivo ainda não é nossa realidade. Desde o ano de 2016, a competição nacional mais importante de Handebol foi modificada. A ideia foi criar uma competição mais abrangente, alcançando mais estados e regiões do país. A Liga, inicialmente, foi dividida em três regiões, chamadas conferências. Uma que abrangia os Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, outra a região Nordeste e mais uma para o Norte. As três regiões jogavam a primeira fase entre si e se cruzavam a partir das quartas de final. As semifinais e finais eram disputadas em local único, indicado pela Confederação Brasileira de Handebol (CBHb).

Neste ano, a CBHb promoveu a competição com 4 conferências. Houve o desmembramento da região centro-oeste, que ficou com uma conferência própria, mantendo-se Sul e Sudeste em uma única competição. A medida adotada ainda em 2016, foi importante para difundir o esporte, mas o campeonato é curto e a maioria das equipes se formam apenas para o curto período do campeonato. É preciso melhoria, que para acontecer necessita de recursos e estes não estão chegando. É uma situação difícil.

A seleção feminina ainda conta com grandes atletas, inclusive campeãs mundiais em 2013. Duda Amorim, melhor jogadora daquela competição, foi eleita a melhor jogadora do mundo em 2014, em votação aberta Federação Internacional de Handebol. Em 2017, foi eleita a melhor defensora. Já nesse ano, disputa novamente o título de melhor jogadora. Alê Nascimento foi eleita a melhor do mundo em 2012,um ano antes do mundial. Alê chegou a pôr em cheque a continuidade na seleção, mas ao que tudo indica continuará a dar suporte à equipe.

Há desfalques também, como Dani Piedade. Porém a seleção tem qualificação para voltar a alçar voos altos. E é nisso que acreditamos e pelo que torcemos.

A torcida mais vigorosa é mesmo para que a nova gestão possa se aproximar mais dos atletas. Escute as dificuldades e opiniões de quem vive o esporte na prática, realize uma coordenação cooperada, econômica e reestruturante, invista na base com prioridade e na especialização de técnicos. Que o Brasil volte a brilhar! 2019 tem mundial sênior e estaremos juntos mais uma vez.

Foto: CBHb

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