Últimas Notícias

Expectativas para Paris-2024, renovação e handebol universitário: uma conversa com Álvaro Casagrande, assistente técnico da seleção feminina de handebol

Álvaro veste o uniforme da selecao (jaqueta verde neon e calça verde) sorri para foto e mostra a medalha. Foto tirada na quadra.
Álvaro Casagrande é o assistente técnico da seleção brasileira feminina de handebol desde 2021. Esteve presente na conquista do Pan de Santiago, em 2023. Foto: acervo pessoal.


São quase 30 anos trabalhando com o handebol: dentro das quadras como treinador de times femininos e masculinos, fora delas sendo supervisor de seleções juvenil e adulta. Do universitário, passando por clubes e chegando ao ápice: seleção brasileira. Álvaro Casagrande, assistente técnico da seleção brasileira feminina de handebol e diretor de seleções na CBHb (Confederação Brasileira de Handebol) é dono desse currículo recheado.

A pouco mais de duas semanas da estreia da seleção nos Jogos Olímpicos de Paris-2024 – seu segundo como integrante da comissão técnica –, o "professa" concedeu uma entrevista ao Surto Olímpico, em que falamos sobre as expectativas para a competição com um time em renovação, ausência de atletas remanescentes do título mundial de 2013, análise das adversárias mais fortes do grupo e um pouco sobre sua carreira no handebol. 

Os Jogos Olímpicos de Paris-2024: expectativas e renovação

Os Jogos Olímpicos de Paris-2024 serão um marco para a seleção brasileira feminina de handebol. Pela primeira vez desde o inédito – e até hoje único – título mundial de 2013, a equipe participará de uma competição internacional sem nenhuma atleta remanescente da conquista. Duda Amorim, por exemplo, considerada a melhor jogadora brasileira de todos os tempos e eleita a melhor atleta de handebol da década 2011-2020, se aposentou durante este ciclo olímpico e não estará em Paris. 

Dessa forma, os Jogos na França representam o fechamento do capítulo mais vitorioso do handebol nacional e o início de um novo ciclo cheio de possibilidades e desafios. Afinal, a comparação é inevitável e a cobrança, constante. 

Diante desse contexto, Álvaro comentou sobre as expectativas para as olimpíadas, que passa pelo bom ciclo olímpico feito pela equipe: 

Tivemos a hegemonia no continente, com as competições Sul-Centro Americano e os Jogos Pan-Americanos, e nos dois últimos mundiais fomos muito bem: em 2021 ficamos em sexto lugar e em 2023, em nono. Então tem sido bons resultados e isso nos traz boas sensações para essa competição. A gente sabe que é muito difícil, todas as equipes são muito fortes, as europeias têm muita tradição, mas a gente entende que pode fazer uma competição da forma que a gente quer: competitiva, sabendo jogar de igual para igual com todos e buscar o primeiro objetivo que é a classificação para a fase eliminatória."

Arte do Time Brasil com a foto do time de handebol comemorando
Desde Winnipeg 1999, o Brasil não sabe o que é sair do Pan-Americano sem a medalha de ouro no handebol feminino. Arte: divulgacão/@timebrasil

Com relação à renovação, ressaltou como o processo vem sendo conduzido desde 2021 sob o comando do técnico Cristiano Rocha e como a mescla entre atletas mais experientes e mais jovens pode ajudar a equipe: 

As meninas mais experientes que ainda estão na seleção têm recebido muito bem as novas, abraçando muito as meninas, passando toda a experiência e vivência. Isso faz com que se tire um pouco do nervosismo e ansiedade das mais novas, para que elas possam jogar mais soltas. [...] elas [as mais experientes] têm também essa função na equipe, de dar equilíbrio e tranquilidade." 

Apesar da sabida renovação, a decisão de deixar a goleira e capitã Babi Arenhart fora da convocação final (ela está na lista de suplentes) fez certo barulho. Segundo Álvaro, foi uma das decisões mais difíceis tomadas pela comissão, mas que foi respaldada nos bons momentos de Renata Arruda e Gabi Moreschi: 

Foi uma das escolhas mais difíceis da lista. A Babi é uma atleta exemplar, experiente, tem jogado em alto nível há muito tempo. E as outras duas [Renata e Gabi] estão despontando também, jogando em alto nível. A Gabriela jogou a Champions League e eu acho que foi muito responsável por sua equipe chegar na final. E a Renata a mesma coisa, jogou a Europa League, fez uma porcentagem absurda no Final Four, foi MVP [melhor jogadora] do Final Four e da liga da Romênia, que é uma liga muito forte. Então as três estão num nível muito parelho e foi uma escolha realmente muito difícil." 


Babi de perfil, com punhos apertados em frente ao rosto comemorando.
Babi Arenhart exercia o papel de capitã da seleção. Ainda não foi confirmado quem ocupará esse posto em Paris. Foto: Daniel Leal-Olivas/AFP

Grupo difícil, mas possível

O Brasil estará no grupo B, com Hungria, Países Baixos, Espanha, França e Angola e fará sua estreia contra a Espanha, no dia 25/07, às 09h (horário de brasília). Os quatro primeiros colocados avançam para as quartas de final. 

O grupo é difícil, com as anfitriãs, atuais campeãs olímpicas e mundiais em 2023, além de Espanha e Países Baixos, seleções que o Brasil enfrentou no mundial de 2023 e foi derrotado. Perguntado sobre as principais lições tiradas dessa competição, Álvaro disse: 

São seleções que temos melhor estudadas, porque acabamos jogando recentemente. Mas a gente vem estudando todas desde o Mundial até os jogos amistosos das fases internacionais que tivemos em março e abril, temos tudo mapeado. E a Espanha, por exemplo, é uma seleção que há muito tempo o Brasil não consegue vencer, mas faz sempre jogos muito equilibrados."

Então a gente tem expectativa de fazer mais um jogo equilibrado com elas, logo no primeiro jogo de estreia, isso é muito importante. E tentar vencê-las, né? A gente sabe que é muito difícil, são equipes europeias que tem um volume de jogo muito maior que o nosso, jogos de alto nível, mas temos buscado desde 2022 fazer fases de treinamento com equipes muito fortes, que estão entre as seis melhores e isso só nos traz mais confiança de que podemos [ganhar]. Nós temos um handebol para jogar no mesmo nível que essas equipes." 

Para ficar no top-4 do grupo, a equipe precisará fazer pontos contra as favoritas. Mas, para Álvaro, é normal as seleções europeias tirarem pontos umas das outras. Equilíbrio é a palavra-chave para entender a competição olímpica no handebol feminino: 

A França é uma equipe super favorita, a equipe a ser batida, mas eu acho que todas as equipes são muito fortes. É muito equilibrado. Se for ver os resultados dos Jogos Olímpicos de Tóquio, a maioria das equipes ganhou e perdeu. Todo mundo perdeu um para o outro. A França foi campeã olímpica e classificou em terceiro lugar na chave."

Estamos conscientes disso e queremos levar essa forma de pensar para as meninas também, para que a gente não relaxe e não desista em nenhum momento. Não tem aquele jogo que você possa falar "não, esse jogo aqui não tem como ganhar" ou "esse jogo aqui não tem como perder", não existe isso. Acho que todos os jogos serão difíceis da mesma forma e vamos tentar encarar dessa forma para que consiga o máximo de foco e tensão em todos os jogos."

seleção francesa comemorando com medalhas e trofeu
A França derrotou a Noruega por 31-28 na final do mundial de 2023 e foi campeã. Foto: reprodução/Europe 1


Fase final de treinamentos na Europa

Após um período de treinamento no Rio de Janeiro focado em condicionamento físico, já que as atletas tiveram 15 dias de férias após a temporada europeia, a seleção viajou para Alemanha no dia 9 de julho. No período que antecede a estreia, os treinamentos serão focados na parte técnica e tática, além de  amistosos contra Alemanha e Eslovênia, seleções do grupo A. Para Álvaro, esse período de treinos e amistosos será essencial para a preparação:  

Esse período vai ser bom para melhorar taticamente e dar ritmo de jogo a todas. Não são jogos que a gente tem necessidade de ganhar – lógico que vamos jogar todos os jogos para ganhar – mas são jogos que a gente precisa melhorar, evoluir, dar ritmo pensando em todas as atletas jogarem para que todas estejam na mesma sintonia física e técnica."

Vamos realmente colocar as nossas ações à prova, nosso jogo ofensivo, tático e de transição. E isso [transição] é uma coisa que a gente tem tentado melhorar a cada competição. Hoje é muito importante você correr no handebol e a gente tá tentando colocar isso para essa próxima fase dos amistosos."

Universitário por amor 

Agora focado totalmente nos Jogos Olímpicos com a seleção brasileira, o dia a dia de Álvaro não fica mais tranquilo quando não há olimpídas. Além das atividades como diretor de seleções e assistente técnico da seleção feminina, Álvaro coincilia o trabalho na CBHb com o de treinador dos times universitários da Medicina USP e UNIP. 

Com passagens por Esporte Clube Pinheiros, Hebraica e São Bernardo, Álvaro deixou os clubes para focar na seleção em 2021. Mas o trabalho no universitário persistiu – mesmo com treinos em horários ingratos, às vezes das 22h às 00h: 

Eu to na Medicina da USP desde 2002, há 22 anos, e na UNIP desde 2006, há 18 anos. É uma paixão realmente. Ali [na universidade] eles têm um período só, até se formarem. Mas eu acho que é muito mais fácil de perceber o quanto eles e elas evoluem no decorrer da graduação. Na Medicina, são seis anos de graduação, então são seis anos que a gente vê esses atletas começando com grandes dificuldades e terminando muito bem, entendendo o jogo, sabendo jogar direitinho com as ideias básicas, melhorando fisicamente." 
É uma satisfação muito grande você ver o quanto eles evoluem nesse período. Isso só me motiva a continuar, é difícil largar sabe? Porque eu vejo muita vontade, dedicação por parte deles de chegar no horário, treinar direitinho, fazer a parte física fora do treino. Tem uma série de coisas: eles assistirem jogos e estarem juntos assistindo adversários e às vezes até ir a um ginásio para filmar um jogo."

São coisas que teoricamente se faz num profissional, mas que eles também se propõe a fazer porque sabem que no futuro pode gerar também títulos e eles são loucos por isso."

Seja na seleção ou no universitário, a busca pela construção de uma equipe forte e competitiva, fundada em um trabalho de longo prazo que possa resultar na conquista de medalhas é uma das principais motivações de Álvaro. 

E em Paris, apesar dos desafios e do caminho difícil, o sonho da medalha inédita segue vivo.

0 Comentários

Digite e pressione Enter para pesquisar

Fechar