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Surto Opina: Cláudio Kano, o "brilho imenso" da transformação do ping-pong para tênis de mesa


Este 1º de julho é marcado pelos 24 anos do trágico acidente de moto que vitimizou o mesa-tenista Cláudio Mitsuhiro Kano (a esquerda) às vésperas dos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996. Kano viajaria no mesmo dia rumo a terceira Olimpíada de sua carreira, mas não resistiu aos ferimentos e veio a falecer aos 30 anos. O sonho do Brasil de conquistar a inédita medalha no tênis de mesa foi interrompido, ainda que momentaneamente.

A ida repentina de Cláudio e sua passagem muito rápida pela Terra assustou o mundo do esporte assim como o próprio Kano já fazia constantemente com suas bolinhas do tênis de mesa que alcançavam 160km/h.

De uma hora para a outra, ia embora aquele que era, até então, o melhor atleta da modalidade no país, a referência internacional que o Brasil possuía. Entretanto, o que ninguém sabia, ou pelo menos não tinha noção ainda, era da importância que Claudio Kano teria para o desenvolvimento desse esporte, que iniciava seus passos para desvincilhar-se da alcunha de ping-pong pela maior parte da população brasileira.


A história

De origem japonesa, foi justamente em um clube japonês, o Clube Showa, localizado na zona sul de São Paulo, que Kano mostrou seu talento para o tênis de mesa, ainda como um menino de 10 anos. A evolução foi gigantesca, indo primeiro para o Clube Hebraica, e em seguida para a fortíssima equipe de São Bernardo; finalmente despontando para vencer grandes atletas internacionais na época.

“Foi no campeonato InterColonial que eu vi o Claudio ainda menino perder e ele chorou. Ele chorou de raiva de ter perdido", disse Minoru Kohakura, heptacampeão intercolonial, no documentário "Brilho Imenso - A história de Cláudio Kano".

Sua arma? Certamente era seu saque. Uma lesão no pé em 1985, semanas antes do Campeonato Mundial em Gotemburgo, na Suécia, forçou Kano a ficar treinando com pé engessado. Para não ficar para trás, o jovenzinho dedicado ficou um mês treinando apenas saque. Resultado: surpreendeu vários mesa-tenistas no torneio com seu poderoso saque.

Seu estilo agressivo no efeito do saque e a forma de tentar sempre definir os pontos rapidamente é muito semelhante ao estilo de jogo do Hugo Calderano, uma clara influência da atitude de Kano.

Cláudio Kano também foi pioneiro em sair do país para enfrentar constantemente os melhores do mundo. Kano foi companheiro de equipe de Jan-Over Waldner (Campeão Mundial em 1989), Jorgen Persson (Campeão Mundial em 1991) e Peter Karlsson (Campeão de Dupla no Mundial de 1991), todos da geração de ouro da Suécia. Claudio Kano foi campeão da Liga Sueca ao lado dessa galera toda, algo parecido com o que Calderano produz hoje na Alemanha.


O poder de campeão

“Raçudo, talentoso e era canhoto. Todo canhoto em esporte individual leva vantagem porque eles são minoria", comentou Manoel Medina, Campeão Latino Americano e ex-técnico do Kano no Clube Hebraica, em depoimento no documentário de 2012.

Kano sabia que era vencedor, tinha certeza de seu talento e da sua capacidade de difundir o esporte no Brasil. Suas idas ao exterior mostravam a sua dedicação para sempre voltar ensinando e encantando. Foi assim em todas as 12 medalhas conquistadas em Jogos Pan-Americanos, alcançando após a edição de Mar del Plata 1995 um recorde de medalhas conquistadas por um atleta brasileiro: sete ouros, três pratas e dois bronzes. Até hoje, suas 12 medalhas o colocam como quarto maior medalhista do país em Jogos Pan-Americanos.

“O campeão reúne todas as qualidade em uma. Talento, técnica, fibra, personalidade... Esse é o campeão, esse é o completo. O Claudio Kano reuniu todas essas qualidades", comentou Biriba, um dos primeiros atletas profissionais do tênis de mesa brasileiro.

Aparições em programas de TV como o “Jô Onze e Meia”, do SBT, "Perfil Otávio Mesquita" da Rede Bandeirantes, “Japan Pop Show” da Rede Gazeta e "Xou da Xuxa", da Rede Globo, comprovam como Cláudio Kano era sinônimo de tênis de mesa no Brasil. Nessa altura do campeonato, o tradicional ping-pong das colônias japonesas já era muito mais compreendido como o esporte olímpico tênis de mesa.

Claudio Kano (à esquerda) no pódio dos Jogos Pan-Americanos Havana 1991 com Hugo Hoyama, seu grande amigo e adversário  - Foto: Sérgio Berezovsky/Estadão 
Seu eterno adversário e companheiro de equipe, Hugo Hoyama, comentou sobre sua ligação com o Cláudio, no último dia 08 de maio, em live no Instagram do Surto Olímpico.

"O Cláudio era o cara que eu tinha que alcançar e eu sabia que para alcançar o meu outro grande objetivo eu tinha que me tornar o número 1 do Brasil. Corri atrás disso, e consegui. Mas mesmo assim, a gente seguiu lutando juntos, pelo tênis de mesa e pelo esporte brasileiro. Até hoje, logo depois do acidente dele, eu coloquei na minha cabeça que eu ia continuar batalhando por mim e por ele. Eu sei que eu estou fazendo o que ele gostaria de estar fazendo também, que é lutar pelo nosso esporte".

No documentário de 2012 contando a história de Cláudio Kano, Fábio Okano, vice-campeão mundial júnior,  comentou sobre o Brasil ter perdido o respeito a nível mundial no tênis de mesa. O respeito, na verdade, nunca acabou, ele sempre esteve ali. A narrativa relata tão bem a história, que Hugo Calderano, atual número 6 do mundo, nasceu apenas oito dias antes do falecimento de Kano.

Cláudio Kano criou o legado brasileiro, mudou o patamar de ping-pong para tênis de mesa, espalhou o esporte pelo país, mostrou a batalha brasileira, deixou a missão para Hugo Hoyama e hoje segue firme, da memória para a vida real em forma de um nome: Hugo Calderano.

Devemos afirmar: Cláudio Kano jamais morreu! Ele certamente está brigando bolinha a bolinha ao lado de Hugo Calderano em busca da inédita medalha olímpica que tanto sonhou trazer ao país.

Em japonês, Mitsuhiro significa brilho imenso, exatamente o que Cláudio Mitsuhiro Kano é até hoje: o brilho imenso do tênis de mesa brasileiro.

Foto: Site oficial Hugo Hoyama

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