Últimas Notícias

Evgenia Medvedeva recebe ataques racistas anônimos durante shows no Japão



A patinadora russa Evgenia Medvedeva, 19 anos, foi vítima de um ataque xenofóbico e racista durante a apresentação do show Fantasy On Ice neste sábado, 8 em Kobe, Japão. Uma mensagem anônima de ódio escrita em papel foi entregue à Medvedeva, com insultos, ameaças veladas e os dizeres "você é preta e pior". A carta exigia que a patinadora saísse do Japão e do Toronto Skating, Cricket and Curling Club do Canadá, onde treina há um ano.

A carta com insultos foi divulgada em um tweet pelo patinador norte-americano Johnny Weir, que também participa dos shows e saiu em defesa de Medvedeva. A mensagem ofensiva, escrita em inglês dizia: "DEMÔNIO. Saia do Japão! Ninguém quer ver sua cara no Japão! Os Japoneses todos odeiam você! Volte para a Rússia! Saia do Japão & saia do TCC (Toronto Cricket Club)! Você é preta e pior! Abandone a patinação!" Johnny Weir, 34 anos, conhecido ícone LGBTIQ+ e um dos principais nomes da patinação dos EUA nos anos 2000 escreveu: "Um de nossos patinadores recebeu esta mensagem hoje de um 'fã'. Como um veterano da patinação, não vou aceitar esse comportamento e não vou tolerar o bullying de um de meus patinadores. Você não tem que ser um fã de todo mundo, mas vai respeitar a todos. Mantenha seu ódio fora deste mundo". Até o final da tarde o tweet de Weir já contava com mais de 6500 compartilhamentos e quase 8 mil curtidas.

Ainda não se sabe da parte de quem exatamente veio esse ataque, mas Medvedeva, bicampeã mundial e medalha de prata nas Olimpíadas de PyeongCheng-2018  tem sido vítima constante de agressões desde o ano passado, quando deixou de modo súbito a técnica Eteri Tutberidze e o clube russo Sambo-70 e foi treinar no Toronto Skating Cricket and Curling Club do Canadá, sob a tutela dos técnicos Brian Orser e Tracy Wilson. Movimentos na internet russa considerando Medvedeva "traidora", com assédio pesado que incluía ofensa racial e ameaças de morte chegaram a fazer a patinadora abandonar as redes sociais por meses. Ela voltou efetivamente às redes após o Campeonato Nacional da Rússia, onde mesmo com uma performance com várias falhas no programa curto foi ovacionada pelo público que lotou o Ice Palace de Saransk, e desde então tem adotado um estilo mais desafiador e de enfrentamento em relação a possíveis detratores.

Evgenia Medvedeva, é filha de pai armênio, e tem como nome original Evgenia Babassyan (de origem armênia), mas adotou o sobrenome da avó (Medvedeva, de origem eslava) quando começou a se destacar. Há preconceito difundido e aberto na Rússia da maioria eslava contra armênios e outras minorias étnicas de nativos da região do Cáucaso. Os nativos do Cáucaso e seus descendentes são considerados na Rússia como pessoas de cor, e são vítimas constantes de ataques racistas bastante pesados além de exclusão econômica e social. Insultos e agressões aos chamados—pejorativamente—de "chornyi" ("preto") ou "chernozhopyi" (literalmente "traseiro preto") são comuns mesmo em ambientes públicos e aparecem de modo aberto na mídia, muitas vezes ditos por pessoas famosas e até políticos. Enquanto se manteve como a número 1 do mundo da categoria individual feminina e treinou no Sambo-70 de Moscou, Medvedeva não recebia uma grande quantidade de ofensas públicas, mas com a ascensão da medalhista de ouro olímpica Alina Zagitova—curiosamente de origem tartar e muçulmana, também integrante de uma minoria constantemente agredida por ofensas étnicas—e a posterior mudança para o Canadá, seu status como descendente de armênios tem sido um argumento para constante para agressões nas redes.

No Japão, país dos shows onde recebeu os insultos, a popularidade de Medvedeva—que é fã de cultura asiática e já fez programas de patinação baseados em animes—oscila entre adoração e ódio, posições que se extremaram também após à mudança de base de treinos para o Toronto Cricket Skating and Curling Club. O clube canadense é o mesmo lugar onde treina o bicampeão olímpico Yuzuru Hanyu, japonês natural de Sendai. Tabloides japoneses especularam se Medvedeva e Hanyu não teriam algum envolvimento afetivo: o que foi negado veementemente por ambas as partes e mesmo sob a observação intensa de imprensa regular, testemunhas e paparazzi ao longo de anos não mostrou quaisquer embasamentos reais até o momento. Fãs de ambos os patinadores no entanto assumiram as informações desses tabloides como motivadoras para batalhas pessoais e tem se dedicado a uma intensa troca de acusações e ofensas online, com alguns chegando a dizer que Medvedeva teria se mudado para Toronto apenas para assediar o colega de treinos—algo também negado pelos patinadores, pelo clube e por seus técnicos. Além da agressão ter sido feita em Kobe, a insistência no bilhete de que Medvedeva era "odiada no Japão" e de que "deveria sair do país e do Toronto Cricket Club" seria um indício de envolvimento desses exaltados fãs asiáticos na agressão, embora ainda não hajam outras evidências.

Os extremos que fãs do Japão e da Rússia tem dedicado à Patinação Artística nos últimos anos tornaram os países extremamente lucrativos para competições e shows com garantia de casas lotadas mesmo com ingressos custando na faixa de milhares de reais. Mas também levaram a criação de ambientes muito voláteis e sujeitos a diversas situações problemáticas. Além das ondas de ódio online que a própria Medvedeva sofreu, e a recente comparação do meio de torcedores de patinação às torcidas violentas de grandes times de futebol, alguns movimentos midiáticos muitas vezes pagos acontecem em ambos os países como forma de causar danos e até encerrar carreiras de patinadores por meio de divulgação de fake news e campanhas virais de ofensas. Em abril deste ano foi desmontada no Japão uma pequena rede que visava contratar indivíduos para postar informações falsas sobre o bicampeão olímpico Yuzuru Hanyu, fazer campanhas negativas contra o patinador em seções de comentários de noticiários e ao mesmo tempo fazer divulgações positivas sobre dois de seus rivais, Shoma Uno e Daisuke Takahashi, além da medalhista de prata olímpica das Olimpíadas de Vancouver-2010, Mao Asada, que parou de competir em 2016. Não se encontrou qualquer evidência do envolvimento dos próprios patinadores no escândalo, que até o presente momento parece ter sido feito exclusivamente por fãs com dinheiro, dispostos a pagar por servidores, postagens e bots.

A organização da turnê Fantasy On Ice foi procurada por jornalistas e público, mas até o momento não divulgou algum comunicado oficial sobre a situação. Por meio do Stories de seu Instagram, Evgenia Medvedeva agradeceu aos fãs que manifestaram repúdio à carta ofensiva, bem como a Johnny Weir por seu posicionamento no caso: "Obrigada a todos por seu apoio e palavras gentis. Quero dizer que estou absolutamente bem e essa carta não me feriu. Não foi a primeira, nem a segunda e nem a terceira vez. O show de hoje foi ótimo, não importa como, e espero que vocês gostem. P.S: Não mereço um amigo incrível como Johnny". A mensagem foi copiada e está disponível em twitters de fãs, que tem compartilhado o conteúdo.

Foto: Yandex.ru

0 Comentários

.

APOIE O SURTO OLÍMPICO EM PARIS 2024

Sabia que você pode ajudar a enviar duas correspondentes do Surto Olímpico para cobrir os Jogos Olímpicos de Paris 2024? Faça um pix para surtoolimpico@gmail.com ou contribua com a nossa vaquinha pelo link : https://www.kickante.com.br/crowdfunding/ajude-o-surto-olimpico-a-ir-para-os-jogos-de-paris e nos ajude a levar as jornalistas Natália Oliveira e Laura Leme para cobrir os Jogos in loco!

Composto por cinco editores e sete colaboradores, o Surto Olímpico trabalha desde 2011 para ser uma referência ao público dos esportes olímpicos, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

Apoie nosso trabalho! Contribua para a cobertura jornalística esportiva independente!

Digite e pressione Enter para pesquisar

Fechar