Surto Entrevista - Ana Rosa Castellain

Se um atleta olímpico sofre bastante para seguir no esporte no Brasil, imagina um atleta de um esporte que não está no programa olímpico. E não adianta, ter três títulos mundiais, dois títulos do Jogos Mundiais, ser recordista mundial, tem que ralar muito- quase sem apoio - para continuar no topo. Esse é o caso de Ana Rosa Castellain, ex-corredora que virou uma das melhores atletas de powerlifting no mundo. Nesta entrevista, ela conta como conheceu o esporte e de todas as dificuldades que ela passa até hoje, para se manter no topo no esporte, que começa a ganhar espaço nas academias de crossfit pelo país afora.

- Em uma breve pesquisa, vi que você começou sua carreira esportiva no atletismo.Como o powerlifting surgiu na sua vida e quando você decidiu mudar de esporte?

Powerlifting surgiu na minha através de uma amiga minha. Ela falou que precisava de mais uma mulher para equipe. Aprendi o esporte numa sexta feira, pois eu já sabia fazer agachamento e supino. Faltou aprender levantamento terra. Aprendi as regras do esporte, como ele funcionava, e no domingo fiz minha primeira competição. Acabei mudando de esporte porque fui dispensada da equipe de Blumenau de atletismo por motivos políticos. Eu tinha resultados para permanecer na equipe e fui dispensada sem motivo algum, quando digo politico é porque minha família tem influencia politica na cidade e já que o partido não fazia mais parte ... Fui simplesmente desligada sem saber, quando fui no banco para retirar meu salario vi que não estava na conta, entrei em contado com o coordenador ele disse que eu tinha sido desligada da equipe.

- Gostaria que você explicasse como é o powerlifting e qual diferença dele para levantamento de peso olímpico

Powerlifting composto por três movimentos básicos , agachamento, supino e levantamento terra, são três tentativas em cada levantamento somando um total. São oito categorias masculinas e sete femininas dividas por peso e idade. levantamento olímpico é composto por arranco e arremesso, dois movimentos onde barra fica sempre acima da cabeça.

- Ser uma das melhores atletas do mundo em um esporte não olímpico te faz ser mais reconhecida (por imprensa, público,etc) no exterior do que no Brasil? Ou essa diferença não acontece?

A verdade não sou nem um pouco reconhecida no Brasil, nem na minha cidade natal nem em lugar nenhum. Posso dizer que pelo esporte a nível mundial as pessoas sabem quem eu sou por eu ter sido campeã mundial, mais não tenho devida popularidade em rede social, por exemplo. Eu acredito que é preciso trabalhar num marketing para conseguir aparecer melhor publicamente. Em doze anos eu me preocupei somente em conseguir realizar meus sonhos como atleta e impus uma meta ate final desse ano. A partir de 2018 quero investir nisso para poder ser melhor vista, para obter patrocínios, mas isso requer tempo, pessoas qualificadas e dinheiro para conseguir algo que eu terei tirar do meu bolso para fazer. Nos demais países existe uma politica melhor, atletas tem tempo para fazer trabalho em mídia, eu trabalho numa media de 10 a 14 horas por dia para conseguir me virar. Não vivo do esporte, essa é a diferença.

- Financeiramente, muitos atletas de esportes olímpicos tem dificuldade em se manter treinando em alto nível. Você tem algum tipo de apoio ou patrocínio? Como você faz para se manter em um esporte que exige bastante treinamento?

Atualmente tenho um patrocínio de uma empresa da Inglaterra que faz material de powerlifitng que se chama SBD Apparel , consegui isso esse ano, e tenho Bolsa atleta do governo federal. Mas mesmo assim eu não deixei de trabalhar, pois o custo desse esporte é muito caro. Tenho pagar todas as viagens, inscrição de competição, pago aluguel. Eu tenho um custo de vida alto, mas hoje tenho uma condição financeira melhor do que há dez anos atras.

- De todas suas conquistas no powerlifting, existe alguma que é mais marcante para você?

Quando fui Campeã do World Games em Cali em 2013, estava trabalhando em três empregos e dormindo quatro horas por noite. Fazia duas matérias na faculdade, fiquei oito meses treinando sem faltar um treino sequer. Teve meses treinei de domingo a domingo, pois meu sonho não podia ser adiado por mais um ano. Escutar o hino nacional sabendo que eu venci uma americana e uma russa, isso não tem preço.

- Você participou dos Jogos Mundiais, e levou ouro duas vezes em 2013 e 2017. Como é participar dos Jogos, que privilegiam os esportes que não estão nos jogos olímpicos?

Significa que você chegou ao nível mais alto do seu esporte, pois só os melhores atletas conseguem participar desse evento, algo que você pode participar a cada quatro anos e quando você esta no evento as pessoas de tratam como se fosse um atleta olímpico.

- Por meio do crossfit, o powerlifting está sendo mais praticado em academias. Acredita que isso é uma boa maneira de popularizar o esporte no Brasil?

Acredito que sim, acredito que isso faz de maneira mundial as pessoas terem conhecimento que isso é um esporte.

- Você já cogitou (ou recebeu convite) para disputar o Levantamento de peso olímpico?

Sim, treinei levantamento olímpico em 2011 por três meses no Rio de Janeiro. Não continuei pelo mesmo motivo do atletismo, envolvia uma politica muito grande e muitas promessas, e eu já era considerada velha, tinha 25 anos na época, para praticar o mesmo. Precisa de um mínimo para continuar morando e treinando no Rio, tenho um filho para criar, e como já sabia da historia não quis sofrer tudo de novo para esperar por promessas que não seriam cumpridas. Mas aprendi muito e agradeço por ter passado por essa fase.

- Você acredita que o powerlifting possa se tornar um esporte olímpico futuramente?

Honestamente... Não. A política esta em todos os lugares e tem que ter alguém muito influente para que isso aconteça.

- Você já foi campeã mundial, dos jogos mundiais, tem recorde mundial... Quais são os seus próximos objetivos no esporte?

Não sou uma pessoa que pretende ter números grandiosos dentro desse esporte, apenas quero fazer mais algumas coisas que poucos fizeram. Meu objetivo agora só poderá acontecer daqui a quatro anos: Eu quero ganhar três títulos mundiais no mesmo ano, Mundial RAW (disputado com poucos equipamentos para auxiliar o atleta a levantar os pesos), Mundial Equipado e World Games. Esse ano perdi o mundial de RAW por 1,5kg. Mas eu fiz minhas melhores marcas da carreira. Isso prova que categoria é muito bem disputada e que esta num nível alto. Terei quatro anos para planejar novamente e tentar algo diferente, quem sabe até la eu consiga ter mais descanso e tempo para me dedicar aos treinos com mais vontade.

Deixe um recado para os leitores do surto olímpico

Tenho uma frase que levo comigo desde 14 anos de idade, de um escritor Blumenaunse chamado Lindolf Bell, " menor que meu sonho eu não posso ser''. Já escutei que não tinha talento para praticar atletismo, que jamais iria conseguir chegar entre as 10 melhores do Brasil, eu consegui realizar isso, fui a quarta melhor.

Tive trabalhar como diarista porque ninguém queria me dar emprego da minha área. Estava me formando em educação física e já era campeã mundial de powerlifting. Escutei que jamais conseguiria ser campeã mundial treinando sozinha, fui campeã treinando sozinha maior parte do tempo. Perdi meu emprego em uma academia depois ter sido campeá mundial. Tive um acidente grave onde quase morri e os médicos me deram mais de um ano para conseguir voltar, falaram que jamais seria a mesma por ter ficado com sequela. Voltei a competir sete meses depois e bati o recorde mundial.

A verdade é você ira cair, ser humilhada, irá pedir ajuda e as pessoas irão virar às costas para você e isso acontecerá inúmeras vezes, mas você não pode deixar de escrever sua historia. A minha é essa, todo mundo dizia que era impossível por que não tinha dinheiro e ajuda, eu fui atras do meu sonho, e hoje inspiro todos aqueles que assim como eu, querem um dia ver o mundo do alto de um pódio. Ouse sonhar todos os dias ... Não desista de seus sonhos e muito obrigada por poder contar minha historia e sobre esse esporte que aprendi a amar tanto.