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FIBA/Divulgação |
(Só quero deixar claro que esta coluna tem as minha opiniões - Marcos Antonio - e que estas opiniões não refletem necessariamente a opinião do Surto Olímpico e de seus colaboradores)
Estava programando para fazer uma coluna nestes tempos de pré-olímpico de basquete, mas não esperava ter que fazer duas, já que a nau do basquete feminino está surpreendentemente à deriva . O técnico José Neto entregou o seu cargo e não é mais técnico da seleção feminina de basquete. Ele se demitiu em solidariedade ao preparador físico Diego Falcão, que trabalha com Neto há 17 anos e foi desligado do cargo após posts em redes sociais supostamente apoiando a criminalização do aborto, o que causou a ira de muitas jogadoras da seleção e que fez a CBB tomar a decisão de mandá-lo embora.
José Neto fez um bom trabalho no comando da seleção, isto é inegável. Pegou uma seleção no fundo do poço, que perdia para a seleção da Argentina e aos poucos foi dando um padrão de jogo para a equipe, principalmente um padrão defensivo. Uma seleção que parecia morta em quadra, passou a ser mais intensa, contestando mais os arremessos – mérito do preparador físico também – e com isso o Brasil foi evoluindo. Acabou tendo uma derrota doída para Porto Rico no pré-olímpico de 2021 que tirou o país de Tóquio, sofreu com o injusto esquema de pré-mundial com 12 vagas – se fosse 16 estaria classificado- em 2022, mas na Americup de 2023, a seleção mostrou força e foi campeão continental. E no último pré-olímpico, acabou perdendo no detalhe, faltando um pouco de maturidade para fechar as partidas. Mas era um trabalho no geral considerado bom, considerando alguns ajustes
E futuro parece promissor, já que o Brasil conseguiu uma futura estrela na seleção, com Kamilla Cardoso,já brilhando na WNBA; outro nome promissor no garrafão e também como Stephanie Soares; um ótimo nome na ala como a Manu - do qual sou fã, um trio de excelentes valores que deve ancorar a seleção feminina na briga pela vaga no mundial de 2026 e a olímpica em Los Angeles-28. Por isso, me decepciona muito toda essa confusão por conta de um assunto totalmente fora da esfera esportiva e quebrou todo um planejamento que deveria estar sendo feito para que o basquete feminino continua sua caminhada evolutiva.
Acredito que por mais que cada um tenha o seu lado e opinião formada por base social, científica ou religiosa, aborto é um tema muito delicado e complexo para ser abordado assim tão superficialmente para ser postado em uma rede social como uma legenda 'simples assim'. Tanto que acabou causando toda uma celeuma desnecessária e que pode vir a ser potencialmente prejudicial ao basquete feminino - Esperamos que não.
É claro que se pode ter uma opinião favorável ou contrária a determinado assunto, estamos em uma democracia, mas a pessoa tem que ter a consciência de que esta opinião tem que ser dada com embasamento, principalmente, com respeito, ainda mais nos tempos tão intolerantes que vivemos nesta era de redes sociais. E pareceu que o clima na seleção era de respeito entre opiniões divergentes, por conta das declarações da pivô Clarissa ao jornal ‘o Globo’, que afirmou que já era sabido das opiniões de Neto e Diego em alguns assuntos, mas havia respeito mútuo em caso de discordâncias entre comissão técnica e jogadoras até então.
O que aconteceu foi que o post de Diego Falcão fez a seleção feminina rachar publicamente, um evento lamentável. Pode até se questionar as decisões da CBB em demitir Diego - como caso de intolerância ou até como bode expiatório para se livrar do Neto - e José Neto entregar o cargo em solidariedade ao amigo de 17 anos, mas em ambos os casos, são decisões compreensíveis, já que o tema acabou furando a bolha, e tudo que fura a bolha ganha proporções grandes demais para serem ignoradas.
Só me incomoda realmente ter visto o José Neto ter respondido em redes sociais o afago de nomes de extrema direita, que claro, usam o caso como palanque político e que indiretamente ele ajudou a inflamar uma horda de acéfalos extremistas, que vociferam ataques às jogadoras de basquete. Assim como me incomoda muito o preparador físico dizer sofrer censura e intolerância religiosa e aceitar ser apoiado pelos os mesmos que atacam cruelmente um padre por ele dar comida a pessoas de situação vulnerável.
Agora, voltando ao âmbito esportivo, resta saber quem poderia comandar esta equipe, já que em dois meses já tem a primeira competição no novo ciclo olímpico. Para mim, o nome seria João Camargo, técnico do Sesi Araraquara, que era um dos assistentes técnicos de José Neto, inclusive comandando o Brasil nos jogos Pan-americanos de Santiago, e que talvez possa manter o padrão de jogo e ir renovando a seleção aos poucos, algo que seria a prioridade neste ciclo olímpico. Mas o treinador e a comissão técnica que forem escolhidos, já sabe que tem de trabalhar em equipe com as jogadoras, principalmente, respeitar as opiniões não só delas, como todas as mulheres.
Agora, só resta aguardar e ver o que a Confederação Brasileira de Basquete vai fazer. Que os dirigentes consigam minimizar todo o impacto negativo que este episódio causou ao basquete feminino e que eles consigam tomar a decisão mais sensata possível para que modalidade não volte a escorregar em sua dura subida e voltar novamente ao fundo do poço.
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