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Surto Opina: a polêmica dos e-sports

Ana Moser é a nova ministra do esporte e afirma que irá garantir acesso aos esportes para todos (Foto: Lucas Seixas/UOL)
Ana Moser é a nova ministra do esporte e afirma que irá garantir acesso aos esportes para todos (Foto: Lucas Seixas/UOL)

A polêmica fala da Ana Moser sobre os e-sports deu o que falar. Em entrevista à Uol realizada nesta semana, a ministra do esporte disse que “o esporte eletrônico é uma indústria de entretenimento, não é esporte”. Em relação aos treinos realizados pelos gamers, ela pontuou: "treina, assim como o artista. [...] assim como a Ivete Sangalo também treina para dar show e ela não é atleta da música”. Para concluir, a ex-atleta de vôlei afirmou que os atletas de e-sports não poderão ter acesso a benefícios como o Bolsa Atleta, Lei de Incentivo ao Esporte, e recursos públicos de Esporte de forma geral devido à modalidade não ser predominantemente física. (Veja entrevista na íntegra)

Para pensarmos sobre isso, conversamos com Rafael Espinheira, de 23 anos, que é publicitário formado pela UFMG com área de pesquisa focada nos e-sports. Ele é surtado pelos games desde os 12 e trabalha como coordenador de comunicação do Campeonato Brasileiro de E-sports Universitários.

E-sports é esporte?

Final do 2º Split do CBLOL 2015, disputada no estádio Allianz Parque, em São Paulo (Foto: Riot Games)
Final do 2º Split do CBLOL 2015, disputada no estádio Allianz Parque, em São Paulo (Foto: Riot Games)

Este é um tema delicado. Rafael pontua que ainda é algo muito novo. "Se não há sequer uma definição de como se escreve a palavra, quiçá haverá uma definição sobre o que ela é, o que ela representa", pontuou.

Por um lado, muitos acreditam que os jogos de videogame são criados para entretenimento, jogar com os amigos e não com o objetivo de competição. Além disso, é pontuado que a principal diferença de e-sports para os esportes tradicionais é a baixa prioridade dada ao esforço físico. Pelo mesmo motivo, o tradicional e popular xadrez não tem pretensões de se tornar um esporte olímpico.

É necessário pensar também na questão da privatização. Até mesmo o gamer Rafael lembra que "nos e-sports, por ser muito ligado ao capital privado, muitos países acabam que nem conhecem (alguns jogos), não têm acesso e nunca vão ter". Ele entende que é complicado pensar em uma modalidade na qual "alguém pode simplesmente te impedir de jogar a qualquer momento".

No outro lado, pensa-se que o futuro é digital, e que nos esportes não será diferente. Rafael pontua que "existem competições de alto nível, existem pessoas que se dedicam 100% - é literalmente o trabalho delas - e tem um público muito grande que acompanha".

Em relação ao entretenimento, é importante lembrar que muitos esportes foram criados para entreter, como o tênis criado a favor dos reis.

Há ainda a discussão sobre a regulamentação da modalidade. Enquanto o e-sport não for regulamentado formalmente e juridicamente ele não terá base legal para ser equiparado com os esportes tradicionais.

Contudo, concorda-se que a fala de Ana Moser teve um equívoco grotesco ao dizer que a modalidade é previsível.

Apoio governamental

Projeto cria a primeira sala gamer de Minas Gerais (Foto: YoGamers do bem)
Projeto cria a primeira sala gamer de Minas Gerais (Foto: YoGamers do bem)

No tocante ao apoio governamental, reconhece-se que o governo deva ter outras prioridades no momento. Ana Moser afirmou que irá trabalhar com as pastas da Educação e da Saúde, dessa forma, não seria possível incluir os e-sports.

Além disso, não podemos esquecer que os e-sports necessitam de equipamentos caros. Segundo levantamento feito anualmente pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 1/3 dos mais pobres não têm acesso à internet. Dos que têm, a maioria acessa a rede pela TV ou celular. Seria preciso corrigir, primeiro, essa desigualdade, possivelmente pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.

Há ainda o fato de que nenhum esporte tradicional exige que você compre um produto criado e fornecido por uma empresa para praticar. Claro, você precisa do material esportivo, mas ninguém detém direitos autorais sob uma raquete, uma bola de vôlei ou uma piscina, por exemplo. Os e-sports só podem ser praticados mediante o uso de uma propriedade intelectual pertencente a uma empresa. Não há lógica no governo financiar um negócio que é 100% privado. As companhias podem colocar seus games de maneira mais acessível financeiramente, mas escolhem não fazê-lo.

Rafael afirma não achar justo dar dinheiro para as indústrias bilionárias de jogos, mas diz que o governo pode pensar em viabilizar o acesso para as pessoas carentes que querem ter contato com a modalidade ou se inscrever nas competições. Ele cita o projeto YoGamers do bem, criado pelo gamer e streamer YoDa Noronha. O Instituto é uma instituição sem fins lucrativos, que tem como objetivo principal promover a inclusão digital, o conhecimento ao universo gamer e a transformação sócio cultural de jovens a partir de 10 anos de idade, matriculados em escolas públicas. O projeto conta com a parceria da Fundação Cultural Chico Xavier, das Secretarias de Educação e Cultura de Pedro Leopoldo, Lagoa Santa e Confins e do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, provando ser possível o envolvimento do governo na promoção dos e-sports. (Saiba mais clicando aqui).

E-sports nas Olimpíadas?

Convocados para representar a Coreia do Sul nos Jogos Asiáticos (Foto: LCK)
Convocados para representar a Coreia do Sul nos Jogos Asiáticos (Foto: LCK)

Em entrevista ao site francês The Big Whale, Emmanuel Macron, presidente da França, declarou que pretende trabalhar para que os e-sports tenham uma conexão com as Olimpíadas de Paris 2024. O político mostrou interesse que o país, no mesmo ano, também receba alguns dos campeonatos mais importantes do esporte eletrônico, como os torneios mundiais de League of Legends (Worlds), Counter-Strike: Global Offensive (Major) e Dota 2 (The International).

Os Jogos Asiáticos, equivalente ao nosso Jogos Pan-Americanos, acolheu os e-sports em 19ª edição, no ano passado. Foram oito modalidades de esportes eletrônicos com distribuição de medalhas. Foram elas: Arena of Valor - versão asiática, Dota 2, Dream Three Kingdoms 2, EA SPORTS FIFA, Hearthstone, League of Legends, PUBG Mobile - versão asiática e Street Fighter V. Em 2018, na Indonésia, houve competições de League of Legends, Arena of Valor, Clash Royale, Pro Evolution Soccer, Hearthstone e StarCraft 2, mas como demonstração. Elas não contaram para o quadro de medalhas. Em 2022, os torneios de e-sports passaram a fazer parte do programa olímpico, conforme deliberação do Conselho Olímpico da Ásia em dezembro de 2020.

Apesar do estranhamento inicial, deve-se lembrar que nem todos foram simpáticos à entrada do skate, alguns lugares chegaram a fazer quadro de medalhas sem as conquistas do surfe e do skate. O mesmo acontece agora com a entrada do break dancing.

Mas Rafael pontua a questão da propriedade privada intelectual. Ele diz que "se você colocar uma modalidade nas Olimpíadas, você vai estar dando um mega destaque para uma empresa”. Dessa forma, a competição seria apenas "uma grande jogada de marketing".

Em resumo, ele diz que é um tópico delicado pois seria necessário ter muita cautela para que ninguém fosse desfavorecido e ressalta que "é o sonho de todo gamer ter uma seleção nacional de seu jogo favorito".

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