O Rio estava um pouco triste. Uma manhã fria e chuvosa, totalmente o contrário do que se espera da cidade carioca, recebeu o último dia dos Jogos Olímpicos. Os dias de competições foram tão rápidos que muitos só se tocaram naquele domingo que a segunda-feira não seria mais olímpica. Ainda assim, o país pode reverenciar uma equipe que era sinônimo de títulos e vitórias para o esporte brasileiro.
Domingo, 21 de Agosto de 2016.
Um Maracanãzinho lotado de pessoas de verde e amarelo. Fora dele, torcedores imploravam e ofereciam altas quantias para comprarem ingressos de outros torcedores de países já eliminados. Todo o país queria estar lá naquela tarde. Na quadra, um time que só mesmo um mestre do esporte como Bernardinho poderia reerguer depois de uma quase eliminação para uma final olímpica.
Do outro lado, uma Itália, tricampeã mundial na década de 90, que queria encerrar o tabu e conquistar seu primeiro ouro olímpico. Reeditando a mesma final olímpica de Atenas-04 os dois países se enfrentavam por um dos últimos ouros em disputa dos Jogos Olímpicos.
O jogo foi rápido, não "fácil" ,mas nem pareceu uma final olímpica com uma vitória de 3x0 (25/22 28/26 e 26/24) sob o comando de um inspirado Wallace que colocou o Brasil novamente no topo do pódio depois de duas pratas seguidas em Pequim 2008 e Londres 2012 e conquistava o tricampeonato. Uma arena em chamas comemorava mais um grande resultado do time da chamada "Era Bernardinho". Aliás, com técnico sob o comando da seleção, o Brasil esteve em todas as finais mundiais/olímpicas desde o título mundial em 2002. Polônia, Estados Unidos, Cuba, Itália e Rússia se revezavam, mas o Brasil sempre estava lá. E, claro, estando na cidade onde o técnico nasceu e se criou, o resultado não poderia ser diferente se não o topo e mal sabia a torcida, mesmo já imaginando, que aquela seria a aposentadoria do técnico comandando a camisa verde e amarela.
Aposentadoria também - esta já anunciada - seria o destino de Sérginho, uma unanimidade quando o assunto é escolher o "melhor líbero do mundo". Líder do time, se emocionou muito após o pódio, onde todos os jogadores foram tirar fotos com familiares, voluntários e torcedores que estavam ali. Para coroar ainda mais a sua carreira, se tornou o primeiro líbero a conquistar o título de MVP em um torneio olímpico. Uma festa linda para comemorar a última medalha brasileira nos Jogos do Rio, mantendo a tradição do país de trazer pelo menos um ouro desde 2004 no vôlei de quadra.
Os campeões de 2008 e 2012, Estados Unidos e Russia respectivamente, se enfrentaram na disputa da medalha de bronze, com vitória para os americanos por 3 x 2, com direito a um 15/13 no último set. Serginho, além de MVP, levou obviamente o título de melhor líbero. Wallace foi eleito melhor oposto e Bruninho o melhor levantador.
O Brasil terminava os Jogos Olímpicos do Rio com sete medalhas de ouro, seis pratas e seis bronzes, totalizando dezenove pódios.
Poucas medalhas foram entregues neste dia. A Luta Olímpica terminou nos Jogos do Rio premiando vinte sete países com medalhas. A Rússia foi a grande campeã com quatro ouros, três pratas e dois bronzes. Japão, Cuba, Estados Unidos, Turquia, Irã, Armênia, Georgia, Canadá e Sérvia também conquistaram medalhas douradas.
A única final feminina do dia veio na ginástica rítmica. Na Arena da Barra, a Rússia, sempre favoritíssima, venceu o ouro da prova por equipes com uma linda e quase perfeita apresentação, demonstrando que realmente estão muito acima das adversárias no esporte. Prata para a Espanha e bronze para a Bulgária.
No ciclismo Mountain Bike, em Deodoro, o suíço Nino Schurter pode comemorar sua terceira medalha olímpica. Depois do bronze em Pequim 2008 e a prata em Londres 2012, o ouro veio com cinquenta segundos de vantagem sobre o tcheco Jaroslav Kulhavy. Bronze para o espanhol Carlos Coloma.
Na Arena do Futuro a poderosa França de Nikola Karabatic era surpreendia pela Dinamarca na final do handebol masculino. Os atletas do país nórdico surpreenderam por 28 x 26 e impediram o triolímpico francês. O MVP do torneio foi o campeão dinamarquês Mikkel Hansen. Com uma vitória de 31 x 26 sobre a Polônia, o bronze foi para a seleção da Alemanha.
Pode não ter sido a melhor apresentação dos últimos tempos nem uma das finais mais animadas, mas era o time americano de basquete em quadra. A vitória do time de astros como Kevin Durant, Carmelo Anthony, Kirye Irving e Klay Thompson foi por tranquilos 96 a 66. Era o décimo quinto título americano em Jogos Olímpicos. Apenas três outros países conquistaram o ouro além dos americanos, sendo que dois deles, Iugoslávia e União Soviética, nem existem mais. O outro foi a Argentina, em 2004, ano da última derrota americana em Jogos Olímpicos, justamente para os hermanos. Duas vezes seguidas vice campeã olímpica, a Espanha de Pau e Marc Gasol conquistava o bronze com um ponto de diferença sobre a Austrália, 88 a 87 para os europeus.
A tradicional prova da maratona olímpica teve o título devolvido ao Quênia depois de ficar com a Uganda de Stephen Kiprotich em Londres 2012. Eliah Kipchoge venceu a prova com chegada no sambódromo marcando o tempo de 2h08m44s. Debaixo de forte chuva e passando por lugares históricos do centro do Rio, a prata ficou com Feyisa Lilesa da Etiópia e o bronze com o americano Galen Rupp. O pódio da maratona seria um dos mais emocionantes ali, pois tradicionalmente, era entregue na cerimônia de encerramento dos Jogos.
Ah, a Cerimônia de Encerramento? Alguém podia ter impedido ela e os Jogos acontecerem aqui pra sempre? Houve até na internet brasileira quem desse a sugestão de fundarmos uma cidade chamada Tóquio e enganar o COI para trazer os Jogos pra cá nos próximos quatro anos.
Brincadeiras a parte, aqueles dias que todo brasileiro sentiu um grande orgulho de pertencer a essa terra estavam acabando. Em meio a problemas econômicos e políticos, os Jogos foram uma injeção de ânimo para o Brasil. Histórias de superação, vitórias, derrotas, viradas, consagração e a criação de novos mitos e o aprendizado sobre novos esportes marcaram milhões de brasileiros, seja dentro ou fora das arenas. Arenas, aliás, que apresentaram mais dos brasileiros para o mundo, seja com as polêmicas vaias ou com a forma irreverente e engraçada de torcer - coisa que me desculpem os japoneses, mas somos insuperáveis.
A cerimônia de encerramento foi, assim como a de abertura, muito bela. Explorando características cultura brasileira que iam desde a "mulher rendeira" até o carnaval, uma forte chuva caia sob o Maracanã (até os Deuses do Olímpo estavam chorando). Após muitos discursos e uma linda apresentação japonesa, a Chama Olímpica foi apagada sob o canto de Marienne de Castro com a música "Pelo Tempo que Durar". Os Jogos do Rio acabavam ali. A cidade carioca, que superava muitas desconfianças, era apresentada de vez ao mundo como a bela e caótica cidade que é, talvez isso que a faça ser tão maravilhosa.
Muitas saudades ficariam nas memórias de todos que se envolveram nos Jogos.
O depoimento final de hoje vem do jornalista Marcel Merguizo, da Rede Globo. Ele conta como foi aquele último dia olímpico pra ele desde a final do vôlei até a Cerimônia de Encerramento. O Surto agradece nossos leitores por nos acompanhar diariamente com as notícias esportivas, afinal, os Jogos acabam, mas o esporte não. E já entrando no clima: 東京2020で会いましょう (Nos vemos em Tóquio 2020).
DOMINGO DE CARNAVAL
Por Marcel Merguizo
Como um dia de domingo, aquele 21 de agosto de 2016 seria especial.
Depois de anos de expectativa, meses de cobertura, semanas morando no Rio, dias e noites de realização dos Jogos no Rio, aquele era o último dia olímpico.
Se o coração dos Jogos pulsava mais forte na longínqua Barra da Tijuca, no Parque Olímpico, os últimos dias tiveram uma brisa diferente, um clima mais carioca. Medalhas de Isaquias Queiroz na Lagoa, ouro de Bruno e Alison nas areias de Copacabana, enfim
o título do futebol masculino no Maracanã. Sol, gente nas ruas, festa! Aquela era a Olimpíada que o mundo esperava ver. O Carnaval seria mais tarde, na cerimônia de encerramento. Mas, como cantava o síndico Tim Maia: "Faz de conta
que ainda é cedo, tudo vai ficar por conta da emoção. Faz de conta que ainda é cedo e deixar falar a voz do coração." Estava chegando a final do vôlei
masculino: um clássico Brasil e Itália.
Nesse clima, cheguei cedo ao Maracanãzinho. Como ocorreu nos 15 dias anteriores, passei pela revista em um dos portões do Maracanã e, por sorte (ou Deus é brasileiro e ajuda quem cedo madruga), depois dos guardas encontrei o
portão principal do estádio aberto. Entrei no gramado por alguns segundos enquanto eram acertados os últimos detalhes da festa que iria ocorrer naquela noite. Lá estava a estilosa pira, as fantasias, só faltavam carros alegóricos.
O domingo de vôlei, então, começaria mais cedo (bem mais cedo, no caso), já que as fases iniciais foram de noites
e madrugadas entre tribuna de imprensa e zona mista. Sim, para as seleções brasileiras aquela disputa era sempre tarde, muito tarde. Já a final masculina contra a Itália foi com o sol brilhando fora do ginásio. Lá dentro, um brilho similar que trazia o
sentimento de confiança sobre uma equipe que passou toda a Olimpíada sob desconfiança.
A seleção que podia ser eliminada ainda na primeira fase diante da forte equipe da França, estava na final. Aquela noite, contra os franceses, aliás, foi decisiva principalmente no lado psicológico daqueles jogadores que fisicamente não estavam no auge.
Curiosamente, aquela vitória na quadra veio na mesma noite que Thiago Braz desbancou outro favorito francês no Engenhão. Mas isso é outra história, que só provocou (literalmente) reações apaixonadas entre jornalistas brasileiros e franceses no ginásio do Maracanãzinho.
Voltemos à decisão olímpica do vôlei. Era só festa... Ok, um pouco de tensão, mas daquelas pré-folia. Arquibancadas lotadas, como em todo o torneio, mas desta vez mais estrelada por convidados VIPs e campeões olímpicos, como Neymar, ali pertinho da quadra
e do parça Bruninho. Este um dos destaques do título, um dos responsáveis pela casca grossa que o time criou, mas um degrau abaixo do protagonismo de outros três astros do ouro olímpico de 2016.
Wallace foi a força. Lipe, a surpresa. E Serginho, a emoção. Era o que Bernardinho precisava em um time inferior tecnicamente à outras campeãs olímpicas e mundiais que ele havia comandado. Mas não faltou superação. Não faltou coração. Os Jogos do Rio acabavam
com o êxtase da torcida brasileira. Estava pronta a passarela rumo à apoteose. A festa não acabaria até o enceramento, em um Carnaval ali ao lado, no Maracanã.
Para encerrar o especial, clique aqui e veja o vídeo oficial dos melhores momentos dos Jogos Rio 2016
Fotos: Equipe Vôlei (Kirill Kudryatsev - AFP) / Serginho (Alexandre Loureiro - COB) / Marienne de Castro (Getty Images)
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