Um dos programas mais recentes na cruzada antidoping, o passaporte
biológico já está em processo de implantação no Brasil. Desde 11 de
março, o uruguaio José Veloso Fernandez, 56 anos, médico especializado
em medicina do esporte e controle de dopagem, com 35 anos de experiência
na área, trabalha como consultor na equipe da Autoridade Brasileira de
Controle de Dopagem (ABCD) e caberá a ele a responsabilidade de
coordenar o programa no país
“O passaporte biológico é uma pesquisa que analisa dados indiretos que
podem apontar o possível uso de doping”, resume o Dr. Veloso. “Nós não
buscamos detectar diretamente o uso de uma determinada substância
proibida e, sim, traçar um perfil individual e longitudinal (vários
dados em uma mesma análise), preferencialmente em vetores de sangue e
vetores esteroidais na urina”, continua o especialista.
Diretor-médico da Organização Antidopagem do Uruguai, Dr. Veloso
acumula uma longa experiência e em seu currículo consta a atuação em
cinco Jogos Olímpicos: Atlanta 1996, Sydney 2000, Atenas 2004, Londres
2012 e Rio 2016. No Uruguai, ele iniciou, em 2011, o trabalho com
passaporte biológico.
A utilização do passaporte biológico foi formalizada pelo comitê
executivo da Agência Mundial Antidoping (Wada, na sigla em inglês) em 1º
de dezembro de 2009, mas sua aplicação na América Latina ainda está em
estágios iniciais.
Na prática, o programa funciona assim: em um determinado período (em
geral de um ano), o atleta tem seu material biológico (sangue e/ou
urina) coletado e as amostras são analisadas minuciosamente levando-se
em consideração alguns parâmetros pré-estabelecidos.
“Os dados são obtidos pelo módulo hematológico (sanguíneo) de análise
de glóbulos vermelhos e outros elementos do sangue, como hematócritos e
hemoglobina, por exemplo. Na urina, são obtidos dados pelo módulo
esteroidal. A partir daí, nós traçamos um perfil para cada atleta”,
detalha o Dr. Veloso.
Para todos os dados analisados, há um limite mínimo e máximo no qual
os parâmetros sanguíneos e de urina podem oscilar. Caso os resultados
das análises ultrapassem esses limites, uma junta de três especialistas é
estabelecida e a partir de suas interpretações o atleta pode se tornar
suspeito de uso de doping.
“A análise dos dados é feita por um painel de três especialistas que
devem ser unânimes no veredito em um mesmo tempo. Os especialistas não
afirmam o uso de doping. O que eles fazem é descartar a hipótese de que
as modificações no perfil se devam a condições patológicas (doenças) ou
genéticas por conta de raça, sexo ou idade. Isso nos permite chegar à
conclusão de que há uma suspeita de doping”, explica o uruguaio.
Essa junta de especialistas deve ser formada, nos casos de análises
sanguíneas, por um hematologista clínico, um médico do esporte e um
fisiologista do exercício. No caso das análises de urina, é necessário
um especialista em análises de laboratório, em doping com esteróides e
em endocrinologia clínica.
“O programa do passaporte biológico é o que há de mais moderno no
controle de dopagem”, destaca Rogério Sampaio, secretário nacional da
ABCD. “A WADA preconiza que as principais NADOS (National Anti-Doping
Organizations, organizações nacionais antidoping de cada país, no caso
do Brasil a ABCD) dêem início a esse programa e como nós não temos no
Brasil alguém com conhecimento nessa área, conseguimos trazer o Dr.
Veloso por meio de um convênio com a Unesco. Ele é consultor
internacional e vai nos ajudar a implantar o programa do passaporte
biológico. Esse ano, o programa já entra em atividade e vai se
fortalecer no país nos próximos anos”, continua Rogério.
“A ideia é fazer nesse ano aproximadamente 40 passaportes biológicos,
30 de sangue e 10 de urina. Em cada passaporte nós teremos, nesta fase
inicial, aproximadamente quatro controles com o mesmo atleta. Com esse
programa, o Brasil se aproxima cada vez mais das principais NADOS do
mundo e eu acho que esse passo em direção da execução do passaporte
biológico é tão importante quanto a instituição do Tribunal de Justiça
Antidopagem. Nós temos avançado a passos largos para que o controle de
dopagem no Brasil seja o mais moderno, o mais seguro e que trabalhe no
sentido de garantir o jogo limpo para todos os atletas”, prossegue o
secretário.
Foto: Divulgação/ABCD
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