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Artigo de opinião: O terrível milagre do doping


Ninguém pode depositar as esperanças em um milagre. Essa frase uma vez foi dita pelo atual presidente da Rússia, Vladimir Putin, e pode ser aplicada no atual contexto vivido pelo esporte russo. Um milagre. O que os oficiais do laboratório de análises de amostras da Agência Russa Antidoping (RUSADA) tentou fazer foi um milagre. A qualquer custo foi organizado um mega esquema de doping patrocinado pelo Estado com o único objetivo de levar a Rússia ao topo do esporte. Enganados fomos, enganados ainda querem que nós sejamos. Enganados não só pela Rússia, mas pela indústria do esporte.

Não adianta a Rússia vir e ameaçar processar, falar que não existem evidências ou provas, tratar de tudo como questão política, o que foi explicitado pelo relatório do professor Richard McLaren é claro. Não houve erro, houve certeza de que ninguém descobriria, mas veio à tona. O sentimento russo de superioridade foi posto à prova e, em muitas vezes, em seu quintal. Não seria admitida uma derrota em eventos organizados em território russo. Os casos das Olimpíadas de Sochi-2014, do Mundial de Natação em Kazan-2015 e do Mundial de Atletismo de Moscou-2013 apenas foram mais graves que os que já eram orquestrados em outros eventos. Temos registros de Pequim-2008, mas a realidade é que isso é muito mais antigo, remete aos tempos Soviéticos, aos tempos da Guerra Fria. Recordes da década de 80 até hoje nunca batidos, recordes não só russos. Até onde vale a pena enganar o mundo para vencer?

Trapaça. Pura trapaça. Uma mentira descarada, sem pudor. Sorrisos e lágrimas nas cerimônias de premiação tão manipulados quanto as amostras coletadas. De que adianta torcer, vibrar por alguém, e depois descobrir que aquilo era uma farsa? Enquanto houver condescendência infelizmente haverá doping e não adianta dizer que esse combate feito contra a Rússia é exemplar. Não é. Adianta punir apenas a Rússia? Os casos, é claro, podem ser mais graves, mas doping é doping. Quantos atletas americanos, por exemplo, já foram pegos em exames antidoping e hoje competem? Competem sob o estigma do doping, sob essa macula eterna na carreira, mas competem. "Russos devem ser banidos!", bradam. Não só russos, ora.

O objetivo das competições é se mostrar o melhor em determinado esporte. O doping mascara e acaba premiando aquele que não necessariamente é o melhor, mas premia. Alguns atletas, é bem verdade, podem ter sido tão vítimas como seus adversários e competido sob efeito de substâncias ilegais sem saber. Eu, particularmente, duvido de que algo do tipo aconteça, pois me nego a acreditar que um atleta não sabe o que está ingerindo, mas vamos considerar essa hipótese.

É o fim da disputa. Temos um vencedor. Dois anos depois o resultado muda. O novo vencedor, porém, nunca terá as glórias de quem foi declarado o melhor no dia da final. Todo mundo sempre vai lembrar da vitória do trapaceiro, por mais que se lembrem dele como um trapaceiro, infelizmente. O que nos resta é seguir torcendo. Torcer para que casos de doping sejam algo que não aconteçam mais. Torcer em vão, mas torcer. O doping sempre está um passo a frente, mas nunca, nunca podemos aceitá-lo. É verdade que avançamos, mas ainda há muito a ser feito. Quem sabe um milagre põe fim a essa prática nefasta. Só um milagre.

Fotos: Valery Melnikov/RIA Novosti; Divulgação; Reuters

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